22 de setembro de 2010

2200 anos separam Isaac Newton dos filósofos pré-socráticos

Ao lado a primeira lei e a segunda lei de Newton, escritas em latim, na edição original, de 1687.
 
Irei me arriscar a escrever sobre um tema que possivelmente alguns não irão me entender se eu não escrever o mais claramente o possível e se vocês não souberem o mínimo sobre física clássica do ensino médio.
 
Esse é mais um post sobre educação, o primeiro eu falei sem estar evidentemente escrevendo somente sobre educação, quando falei a respeito da maiêutica.
 
Qual é a relação entre Isaac Newton e os filósofos pré-socráticos? Para ilustrar este assunto, irei usar uma experiência pessoal pela qual se não fosse ela eu talvez nunca fosse perceber essa relação.




Uns 4 anos atrás mais ou menos um professor de física dando aula sobre Dinâmica a respeito da lei da gravitação universal e as três leis de Newton me explicou como surgiu a fórmula que estávamos estudando. A partir daí, aprendi como todas as fórmulas se originam, mas não como alguns estão pensando agora que a resposta a minha pergunta tenha sido por exemplo, que uma fórmula do Eletromagnetismo surgiu de uma da Dinâmica, não... isto seria simplório demais. Vou explicar agora o que nós dialogávamos. A fórmula a qual nós estávamos discutindo era esta:


Ele como um verdadeiro estudioso da física e mais do que isso, um excelente profissional da educação, ensinava física aos moldes do que deveria ser hoje em dia, explicando não somente que os corpos materiais originam campos gravitacinais no espaço que os cerca sendo a Terra um deles ou explicar a força que o campo gravitacional terrestre exerce sobre as massas e partículas na Terra, nem somente dizer de que fórmula surgiu esta citada acima, muito menos explicar no quadro negro como fazer a fórmula e como retroceder a fórmula a partir do resultado para explicar como se chegou àquele ponto, mas sim também e não somente, explicar porque se divide as massas pela distância entre os dois corpos ao quadrado, porque existe uma "potenciação ao quadrado", porque existe uma radiação em algumas fórmulas, associando a explicação destes porquês aos próprios fenômenos que estão sendo estudados, elucidando de uma fórmula simples que um leigo no assunto entenderia facilmente. Esse era o estilo de dar aula do professor de física que me ensinou esta matéria a mais ou menos quatro anos atrás e que até hoje não vi um profissional da educação fazer o que ele faz para ensinar física, ensinar de uma maneira didática e que a gente veja funcionalidade no que a gente aprende para a vida prática, para o cotidiano! Muitas vezes os estudantes vêem a matéria sem utilidade prática, e perguntam "Porque preciso aprender Juros Simples em Matemática Financeira se não vou usá-la para nada?", "Porque preciso estudar lei dos senos e dos cossenos se não vou ser arquiteto e nem mesmo o arquiteto usa isso na sua profissão?" ou exclamam "Estudar história não faz sentido, não consigo compreender o modo de vida da sociedade de antigamente, o que o professor explica não me faz parar de ter uma idéia estática daquela sociedade, porque me sinto apático quanto aquela sociedade. Ele está me ensinando coisas irreais, fantasia!". Há uma debilidade no ensino fundamental e médio mesmo em escolas particulares por conta de professores que mesmo eles não entendem a profundidade do que estão ensinando e do que aprendeu ao longo de anos, não somente por culpa dos governadores - como a maioria faz só culpando o governo -, mas pelo próprio desinteresse do profissional em estudar seriamente o que ele decidiu passar a sua vida ensinando. Entre outros fatores de uma péssima educação.

Me surpreende como nós não percebemos a relação de uma coisa com a outra, nós ainda não temos o hábito de questionar as coisas, não conseguimos ver as coisas com os olhos de um artista, tudo para nós é tão normal! Não somos mais tão capazes de nos adimirarmos com as coisas, porque já estamos habituados a elas, como disse Jostein Gaarder no livro O Mundo de Sofia. Não nos perguntamos porque e de que diabos surgiu uma radiciação, uma potenciação numa fórmula, ninguém pergunta como só utilizamos a radiciação em algumas fórmulas e em outras não, nem porque utilizamos uma estrutura matemática para alcançar a realidade através do pensamento, ou como nossos sentidos percebe a maneira como a estrutura matemática aparece para nós sob a forma de qualidades opostas, como os números pares e ímpares, quente-frio, seco-úmido, áspero-liso, claro-escuro e etc. Esses questionamentos de dualidade já tinham sido feitos por Pitágoras. Para Pitágoras, a resposta a este problema que não perguntamos é que as qualidades sensoriais que nos aparecem e a estrutura invisível da Natureza é de tipo matemático e alcançada apenas pelo intelecto, ou inteligência. Mas porque só por meio de estruturas matemáticas explicamos a realidade ao nosso redor? Será que não existe outro meio?

Isaac Newton escreveu um livro que explicava o que esse meu ex-professor ensinava na sala de aula, como se produzia uma fórmula para explicar tal fenômeno entre outras coisas. Este livro é o Philosophiae Naturalis Principia Mathematica (Princípios Matemáticos da Filosofia Natural) considerado um dos mais influentes da História da Ciência. Somente pelo que já falei até agora seria o suficiente para se provar a relação que existe entre Newton e os filósofos pré-socráticos, já que Pitágoras de Samos é um pré-socrático da Escola Itálica, mas não termina aí a relação que percebi entre eles.

Os filósofos pré-socráticos estudam um conteúdo definido, a cosmologia, conhecimento racional da ordem do mundo ou da Natureza. Pergutavam por que os seres humanos nascem, crescem, envelhecem, ficam doentes e morrem; por que chove; por que uma maçã se estraga; por que em lugares altos como a montanha faz mais frio do que em lugares baixos se o pico de uma montanha está recebendo mais radiações solares por estar mais próximo do sol; por que o céu é azul entre outras perguntas. As principais características da cosmologia que estudam a origem do mundo e as causas das transformações da Natureza são:
  • Tudo se transforma, sem desaparecer, assumindo uma forma diferente;
  • O elemento eterno, perene onde as coisas nascem e para onde voltam é invisível ao olho nú mas visível para o pensamento (physis, o elemento primordial eterno), que dá origem a todos os seres vivos diferentes, princípio gerador imortal sendo o que ele gera mortal; e,
  • Devir, regido pela physis, princípio fundamental do mundo.
Todos esses três pontos se transformam em um, todos centrados na physis. Para Tales esse princípio gerador era a água, tudo viria da água; para Anaximandro, o ilimitado sem qualidades definidas; Anaxímenes considerava o ar ou o frio; Heráclito o fogo; Leucipo e Demócrito o átomo.

Mais do que estudar de onde tudo se origina, eles estudavam e tiravam suas conclusões a partir de quase nada, a "ciência" naquela época era mais precária do que se podia imaginar. Eles se utilizavam da intuição e da dedução para solucionar seus problemas, logicamente que todas as conclusões a que chegavam, independentemente de estarem corretas ou não, eram baseadas no bom senso e em muita imaginação, pois não tinham instrumentos elaborados para medir, testar e comprovar, não tinham telescópio para descobrirem mais informações a respeito da physis. A genialidade dos pré-socráticos estava em gerar um conhecimento a partir de raríssimos pontos de referência que o ajudassem a progredir no conhecimento, sem se utilizar dos mitos e de fundamentos religiosos para explicarem tudo o que está ao seu redor. Sendo o maior expoente da época ao meu ver Hipócrates, o pai da medicina, que achava a explicação de doenças e suas curas nos próprios fenômenos que ocorriam no corpo da pessoa, sem atribuir causas a divindades e entidades que estavam interferindo na vida humana por motivos de causas morais e éticas de sua vida.

Isaac Newton partiu de poucos pontos de referência para gerar um novo conhecimento, a descoberta do cálculo, onde principalmente ele nos mostra como ele prova que o mundo é cognoscível através das estruturas matemáticas. A complexidade de seu pensamento, o questionamento de coisas que até então não despertavam o interesse dos outros pensadores porque estavam habituados com os objetos com os quais trabalhavam, o separa dos pensadores que vieram após os filósofos pré-socráticos. Ele deu sentido ao complexo jogo de fórmulas que eram utilizados na física para explicar os fenômenos da Natureza, partindo do princípio de René Descartes de que devemos voltar ao ponto zero do nosso conhecimento e reavaliar o que aprendemos e o que é dito como verdade nos dias de hoje para se provar por A+B as pequenas verdades para chegarmos em um conhecimento seguro e sólido. Newton apresenta no seu ser o que muitos pensadores ignoram inconscientemente, conhecer o que não está sendo percebido por ele. A frase de Descartes ilustra bem isso: "Daria tudo que sei pela metade do que ignoro". Por isso que volto a afirmar que mais ou menos 2200 anos separam Isaac Newton dos filósofos pré-socráticos. Considerando que por 1000 anos a ciência não se desenvolveu aos moldes gregos e que só no mundo moderno a partir de Newton o modo de pensar pré-socrático (pensamento intuitivo, imaginativo e criativo, com base em poucas premissas utilizada para descobrir novas coisas e vislumbrar o que os olhos do espírito teimam em enxergar) voltou à tona.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.